Muitas culturas ao redor do mundo apresentam todos os tipos de criaturas míticas, mas poucas são tão únicas e criativas quanto as criaturas míticas da mitologia japonesa.
Nada oferece tantos insights sobre a cultura tradicional do
Japão quanto aprender sobre suas criaturas míticas. Esses seres sobrenaturais
únicos, ou 妖怪 (Youkai), como são chamados em japonês, são criaturas
travessas que podem ser puramente más ou ajudá-lo em momentos de necessidade,
por um preço, é claro. Em comparação com a mitologia ocidental, as criaturas
míticas japonesas tendem a ter concepções muito mais criativas, desde amálgamas
de diferentes animais até cabeças voadoras e objetos inanimados ganhando vida.
Muitas dessas criaturas míticas são benevolentes, mas
algumas podem ser aterrorizantes e serviram de inspiração para muitos artistas
japoneses Ukiyo-e, ukiyo-ye ou ukiyo-ê, bem como para histórias de terror
japonesas. Abaixo, você pode descobrir mais sobre alguns dos Yōkai ou Youkai
mais estranhos encontrados na mitologia japonesa.
1. Tanuki – As Criaturas Míticas Japonesas Mais Travessas
O primeiro, e possivelmente um dos Youkai mais conhecidos, é
o cão-guaxinim, também conhecido como Tanuki no folclore japonês. Embora os Tanuki
sejam animais reais encontrados na natureza japonesa, eles inspiraram muitas
lendas e contos populares na mitologia japonesa sobre os chamados Bake-danuki
(lit. guaxinins monstruosos).
Bake-danuki são criaturas poderosas e travessas com uma
personalidade alegre e jovial. Eles não são inerentemente maus, mas adoram usar
sua forte mudança de forma e possuir poderes para pregar peças em viajantes e
roubar seu dinheiro – apenas para se divertir.
Embora anteriormente considerados na mitologia japonesa como
guardiões do mundo natural, hoje em dia os Tanuki são mais associados à sua
natureza malandra. Eles podem se transformar em outros humanos, outros animais,
objetos domésticos inanimados ou até mesmo partes da natureza, como árvores,
pedras e raízes. Eles podem pegar qualquer viajante de surpresa e pregar peças
neles.
Os contos populares japoneses definitivamente não tentaram
manter as coisas amigáveis às crianças: na maioria das vezes, os Tanuki são
retratados na arte usando seus testículos excessivamente crescidos como mochila
de viajante, ou às vezes até como tambores. Isso desencadeou outro fenômeno no
folclore japonês, chamado Tanuki-Bayashi – pessoas ouvindo sons de tambor ou
flauta vindos do nada no meio da noite, possivelmente explicado pela natureza
travessa dessas criaturas míticas japonesas.
Você pode encontrar muitas estátuas de Tanuki ao redor dos
templos no Japão. Na maioria das vezes eles são representados carregando uma
garrafa de saquê, simbolizando a virtude, e tendo uma barriga e olhos grandes,
além de um chapéu para protegê-los da má sorte e do mau tempo.
O filme do Studio Ghibli (um dos estúdios de animação mais
populares do Japão), Pom Poko, gira em torno da vida dessas criaturas míticas
japonesas e as pinta de uma forma positiva e bem-humorada.
2. Kitsune – As Divinas Criaturas Míticas do Folclore Japonês
Kitsune, ou raposas míticas, são outro Youkai famoso na
mitologia japonesa. Eles são conhecidos por serem criaturas míticas japonesas
mágicas e altamente inteligentes que possuem muitas habilidades mágicas e
espirituais poderosas, incluindo mudança de forma, visão de longo alcance, alta
inteligência e expectativa de vida mais longa. No folclore japonês, o kitsune
pode ser um símbolo do bem e do mal e acreditava-se que criava uma nova cauda a
cada 100 anos de vida nesta terra. Os kitsune mais poderosos foram as raposas
de nove caudas, que dizem ter adquirido conhecimento infinito e o poder de ver
tudo o que é, foi ou será.
A mitologia japonesa reconhece dois tipos de kitsune. O primeiro
tipo de kitsune, Zenko (lit. 'raposas do bem’), descreve um tipo de raposas
benevolentes com poderes celestiais, mais conhecidas como os mensageiros
divinos do Deus Inari, protetor dos campos de arroz, da prosperidade e da
fertilidade. Você pode encontrar muitas estátuas representando esses youkais
elegantes e sobrenaturais em santuários dedicados a Inari, espalhados por todo
o Japão. Felizmente, esses templos são facilmente reconhecíveis por seus
típicos edifícios vermelhos e portões torii vermelhos.
O santuário mais famoso construído para celebrar a divindade
Inari é o santuário Fushimi Inari, localizado perto de Kyoto, que atrai muitos
visitantes de todo o mundo durante todo o ano.
Os Kitsune nem sempre foram vistos como espíritos divinos e
benevolentes. O outro tipo de kitsune reconhecido na mitologia japonesa foi
Yako (ou Nogitsune, lit. ‘raposas maldosas), raposas metamorfas que adoram
pregar peças em humanos, ou muito pelo contrário, recompensá-los, dependendo de
seus atos.
3. Kappa – Os Habitantes Únicos de Lagos e Rios
A maioria dos Youkai na mitologia japonesa são mais do que
animais com poderes sobrenaturais, alguns são incrivelmente únicos na aparência
e possuem muitas habilidades estranhas.
Kappa, Kawatarō ou ainda Kawatora é um Youkai, considerado
um Suijin (lit. Deus da Água). Kappa é uma criatura mítica humanoide japonesa
com algumas características que lembram anfíbios e répteis. Eles tendem a
parecer diferentes de um Kappa para outro; alguns têm corpos adultos ou infantis,
com pele colorida em vários tons de verde. Sua pele pode ser viscosa ou coberta
de escamas, e seus braços e pernas ficam presos entre os dedos das mãos e dos
pés.
Por mais únicos que sejam, todos os Kappa têm uma carapaça
de tartaruga nas costas, uma boca que lembra um bico e um objeto que lembra uma
tigela na cabeça, na qual carrega um líquido que se diz ser sua força vital. Se
o líquido derramar ou a tigela for danificada de alguma forma, um Kappa pode
ficar incrivelmente enfraquecido ou até morrer.
Os Kappa não são necessariamente amigáveis e podem pregar
peças inofensivas nos viajantes, ou muito pior: eles são conhecidos por atrair
humanos (especialmente crianças) para seus rios para afogá-los. Eles gostam
especialmente de sumô, um esporte tradicional japonês, e podem desafiar esses
viajantes para uma partida. Cuidado, entretanto; eles também são especialmente
bons nisso.
Na mitologia japonesa, a comida favorita do Kappa eram
pepinos, o que fez com que os rolos de sushi recheados com pepino (ou maki)
fossem tradicionalmente chamados de Kappamaki.
4. Tengu – O Misterioso Youkai de Cara Vermelha
Tengu
é outro ser sobrenatural japonês que aparece em muitas formas ao longo da
história. As primeiras representações de Tengu os mostravam como monstros com
características semelhantes às de um corvo, como asas negras semelhantes a
pipas, cabeças de pássaros e bicos. Mais tarde, representações mais recentes
mostram Tengu como criaturas de nariz comprido e rostos vermelhos.
No início, os Tengu eram considerados criaturas míticas
japonesas travessas, mas não eram inerentemente maus ou particularmente
perigosos, pois eram muito fáceis de evitar ou derrotar. Muitas lendas falam
dos Tengu como portadores de guerra e destruição, mas eles também foram conhecidos
como divindades protetoras e espíritos de montanhas e florestas ao longo do
tempo.
Existe outra forma de Tengu na mitologia japonesa, que é o
Daitengu (lit. ‘maior Tengu’). Daitengu é uma forma evoluída de Tengu, com
características mais humanas e geralmente descrito como uma espécie de monge.
Os Daitengu usam túnicas longas e têm rostos vermelhos e narizes compridos.
Normalmente, seus níveis de potência são diretamente proporcionais ao tamanho
de seus narizes. Eles vivem sozinhos, o mais longe possível dos assentamentos
humanos, em florestas ou no topo de montanhas remotas, passando os dias em
profunda meditação.
O propósito do Daitengu é alcançar a perfeição e grande
sabedoria através da autorreflexão, mas isso não significa que eles sejam
sempre contidos e pacíficos. Diz-se que alguns Daitengu causaram muitos
desastres naturais e sofrimento aos humanos, num simples ataque de raiva.
5. Shikigami – O Lado Negro da Mitologia Japonesa
A mitologia japonesa tem muitas lendas e criaturas
aterrorizantes, e os Shikigami (式神) são um ótimo exemplo de tais
entidades. Traduzido literalmente como “espíritos cerimoniais”, os Shikigami
são servos espirituais sem livre arbítrio que aterrorizam o povo japonês há
séculos.
Tradicionalmente, os Shikigami eram considerados servos de Onmyoji,
membros da sociedade japonesa que se acreditava possuírem e usarem poderes
mágicos divinos. Esses Shikigami nasceram através de um complexo ritual de
conjuração feito por um Onmyoji e serviam apenas a um propósito: realizar os
desejos do mestre. Na maioria das vezes, as ordens de um Onmyoji eram menos
favoráveis (como espionar alguém, roubar ou até mesmo assassinar). Por causa
disso, a parte mais assustadora dessas lendas em torno de Shikigami não eram as
criaturas em si, mas as coisas terríveis que os humanos eram capazes de fazer
quando estavam no comando desses servos devotados.
Os Shikigami são em sua maioria invisíveis ao olho humano, a
menos que assumam formas especiais. Algumas das formas possíveis são bonecos de
papel, alguns tipos de origami ou amuletos, mas o mais popular é transformá-los
em manequins de papel dobrados e cortados de maneira organizada e artística. Os
Shikigami também podem assumir a forma de animais, pois são conhecidos por
possuírem galinhas, cães e até vacas, em sua busca para cumprir as ordens de
seu mestre.
Criar um Shikigami não era uma tarefa difícil, mas manter o
controle de um definitivamente era. Se um mestre Onmyoji não fosse forte o
suficiente, eles poderiam perder o controle do Shikigami que invocaram, fazendo
com que ganhassem consciência e livre arbítrio para fazer o que quisessem,
incluindo matar seu antigo mestre.
6. Tsukumogami – As Criaturas Míticas Japonesas Mais Exclusivas
Uma das maiores e mais exclusivas categorias de Youkai na
mitologia japonesa é, sem dúvida, a dos Tsukumogami.
Tsukumogami são tradicionalmente considerados ferramentas ou
utensílios domésticos de uso diário que adquiriram um kami (ou espírito)
próprio, após viverem por pelo menos cem anos. Embora geralmente considerado
inofensivo, há casos de Tsukumogami se tornando vingativo contra as pessoas que
podem tê-los maltratado ou abandonado ao longo de suas vidas.
Entre esses Tsukumogami existem alguns que são os mais
famosos da mitologia japonesa. Os primeiros são Karakasa-obake ou Kasa-obake (lit.
guarda-chuvas monstruosos), monstros representados como guarda-chuvas de uma
perna só, com um olho e às vezes braços e uma língua comprida. Não está claro
qual era o propósito desses Kasa-obake no folclore japonês, mas muitas
ilustrações deles foram encontradas ao longo dos anos.
Outro exemplo de Tsukumogami encontrado principalmente em
ilustrações é Chōchin'obake ou chōchin-obake, uma lanterna que se torna
consciente após 100 anos. Estando gasta, a lanterna se rasgava e mostrava uma
língua, quando a abertura se tornava sua boca. Às vezes, Chōchin-obake são retratados
com rostos humanos, mãos ou até mesmo asas.
Boroboroton é um ótimo exemplo de um Tsukumogami malvado –
eles não hesitarão em causar danos se acreditarem que você merece. Boroboroton
são tapetes de dormir japoneses (ou futon), que ganham vida depois de terem
sido usados e desgastados por 100 anos. Eles ganham vida depois de terem sido
maltratados durante tantos anos, mas alguns também podem ganhar vida se se
sentirem negligenciados ou desnecessários. Eles guardam rancor dos humanos e
saem à noite para estrangular humanos adormecidos e se vingar.
O último Tsukumogami notável é o Ungaikyō, ou “espelho além
das nuvens”. Ungaikyō são espelhos assombrados que mostram a quem olha para
eles uma versão distorcida e aterrorizante de si mesmo. Diz também que eles eram
usados para capturar espíritos vingativos e demônios dentro deles.
A cultura japonesa realmente se diferencia da ocidental,
através da arte, do estilo de vida e, especialmente, de sua vasta e única
mitologia – aprender sobre todas as diferentes criaturas presentes no folclore
japonês abre as portas para entender um pouco mais sua cultura.